Um paradoxo da transição energética é a substituição do uso de combustíveis fósseis por recursos minerais cuja extração e refinamento podem impactar negativamente os ecossistemas, as espécies e as comunidades.
É o que acontece com o lítio, um mineral que era tradicionalmente utilizado no vidro e na cerâmica por proporcionar maior aderência e dureza. Atualmente, ele é utilizado principalmente na fabricação das baterias usadas pelas tecnologias que evitam ou reduzem o uso de combustíveis fósseis. E isso tem aumentado a sua procura, mascarando ou minimizando os graves impactos sociais e ambientais que a sua extração implica.
O lítio é um mineral muito procurado por suas propriedades únicas:
Essas qualidades fazem dele um material fundamental na fabricação de baterias de celulares, computadores e, principalmente, de veículos elétricos. Por servir para armazenar energias renováveis não convencionais, como a eólica e a fotovoltaica, o lítio é considerado fundamental para a transição energética.
As principais fontes de lítio são os salares, zonas úmidas cobertas por uma crosta salina e contendo salmouras, que são corpos de água nos quais muitos sais e elementos estão dissolvidos, incluindo o lítio.
Os salares são atraentes para a indústria de mineração devido à relativa facilidade técnica de exploração, baixos custos operacionais e pouca demanda de energia para extrair o lítio em comparação com outras fontes.
Em todo o mundo, os salares da Argentina, Bolívia e Chile concentram 54% dos recursos de lítio (potencial de exploração). Além disso, Argentina e Chile possuem 46% das reservas (parcela de recursos conhecidos e comprovados, cuja exploração se mostrou economicamente viável) de lítio no mundo.
A indústria mineira chamou a região que concentra o mineral de “triângulo do lítio” – porque é a única coisa que lá se vê – e abrange o nordeste da Argentina, o norte do Chile e o sul da Bolívia.
No entanto, naquela região há muito mais do que lítio.
Existem também comunidades, ecossistemas e espécies que dependem desses salares. Os que vivem na região dedicam-se à pecuária de pequeno porte e à agricultura de subsistência, atividades que necessitam de água - um bem escasso nessas latitudes.
O procedimento é o seguinte:
A extração de lítio, particularmente por esse método, envolve um enorme consumo e perda de água porque:
A extração de lítio é uma ameaça aos salares da América do Sul – que são áreas úmidas andinas—, compromete a disponibilidade local de água e coloca em risco a sobrevivência das comunidades e espécies que vivem no entorno desses frágeis ecossistemas.
A transição energética é urgente, mas deve ser justa e não feita à custa da extração de outros recursos naturais que colocam em risco as pessoas e o ambiente.
-Maritza Tapia, "Chaves do lítio: o metal mais leve e com maior potencial eletroquímico", Universidade do Chile.
-Heinrich Böll Stiftung Colômbia, "Lítio: os custos sociais e ambientais da transição energética global".
-Florencia Ballarino, "O que é lítio, para que serve e de onde é extraído na Argentina?", Conferiu.
-Wetlands International, "O impacto da mineração de lítio nas zonas úmidas dos Altos Andes".
-Rodolfo Chisleanchi, "‘Triângulo de Lítio’: a ameaça às salinas da Bolívia, Chile e Argentina", Mongabay Latam.
-NÓS. Pesquisa Geológica, Resumos de Commodities Minerais, janeiro de 2023, "Lítio".